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CAMISINHA - O USO DE PRESERVATIVOS E A IGREJA CATÓLICA

Caríssimos irmãos e irmãs : hoje gostaria de ter com vocês uma conversa amigável. Somos uma família. Uma família mais unida do que julgam aqueles que não nos conhecem. E na família há esses momentos gostosos de conversa depois do almoço, na varanda, no quintal ou na sala tomando um cafezinho. Desejaria, agora, se vocês me permitissem, entrar no seu lar, sentar-me ao lado de vocês e, num cálido ambiente familiar, ir falando daquilo que me preocupa e que penso ser motivo de preocupação e de perplexidade para vocês, como fazem os irmãos entre si, os pais com os filhos, os filhos com os pais e os amigos de verdade. É provável que esse nosso encontro se prolongue por um certo. É bom que seja assim. Deste modo, tudo o que gostaria de lhes comunicar, penso, ficará claro e, provavelmente, a partir dessa nossa conversa, vocês sairão mais esclarecidos e se sentirão mais fortalecidos para abordar esse tema com os seus filhos, vizinhos, amigos e irmãos na fé. Ultimamente, têm aparecido nos jornais, revistas e televisão – inclusive num programa de grande audiência – ataques à nossa grande família que é a Igreja, chamando-a de “retrógrada” e “medieval”, e tratando o Cardeal Alfonso López Trujillo, que trabalha no Vaticano como Presidente do Pontifício Conselho para a Família, de uma maneira afrontosa. Culpam-no, erradamente, de não ter apresentado nenhuma pesquisa sobre a ineficácia dos preservativos. Também por esta razão, vi-me obrigado a citar bastantes pesquisas sobre esta matéria. Trabalhos estes que também são do conhecimento de Dom Alfonso. Os questionamentos Alguns meios de comunicação questionam: como é possível que a Igreja não recomende o uso dos preservativos ? Não é este o método mais eficaz para deter o avanço dessa doença que está se convertendo numa verdadeira epidemia endêmica de âmbito planetário ? “A Igreja nega o óbvio”, apregoa a manchete de um importante jornal paulistano ... Talvez nós, que amamos a Igreja, nos sintamos constrangidos quando o Ministério da Saúde, ou a Organização Mundial da Saúde ( OMS ), expressa opiniões semelhantes. Vamos, por isso, raciocinar juntos num âmbito familiar . Muitos de nós já enviamos a diferentes jornais artigos e cartas que tentavam esclarecer o problema. Mas ou não os publicam ou os publicam fracionados ou incluídos num contexto que os desfigura. E é por isso que sinto necessidade de abrir o coração e falar agora, sem entraves, à nossa querida família cristã. Esta é a razão de ser desta carta familiar. Num clima sereno, sem polêmicas, irei deixando fluir os meus pensamentos, procurando que prevaleça o bom senso e a ponderação. A OMS parte de um fato: os costumes atuais não seguem as normas tradicionais, em que as relações sexuais estão destinadas a consumar um amor estável dentro do matrimônio onde, como fruto desse amor, hão de vir os filhos, criados e educados dentro desse âmbito familiar. Isto, porventura, poderia ser considerado como o “ideal” mas – argumenta-se – não podemos viver de “idealismos” , mas de realidades. E a realidade é bem diferente. Os jovens começam a ter relações sexuais antes do matrimônio; muitos não se cansam, e mantêm relações eventuais e transitórias; as moças jovens com freqüência deixam-se levar pelos seus impulsos e sentimentos, não se vive a fidelidade conjugal ... Há, enfim, em não poucos ambientes, um clima de permissividade ou até de promiscuidade, bem diferente de um eventual e teórico “ideal”. E é preciso encarar essa realidade, deixando de lado certos princípios, que estão sendo ultrapassados pelo progresso das ciências e das descobertas dos fármacos anticoncepcionais e dos preservativos. A verdade é que a Igreja está fora da realidade. Continua-se argumentando: Qual é o método mais seguro, barato e de fácil divulgação ? O preservativo. Mas o preservativo não tem falhas ? Alguns representantes do Ministério da Saúde e da OMS dizem taxativamente que não. Outros, contudo, admitem que elas existem, mas argumentam deste modo: admitamos que os preservativos tenham 10% de ineficácia, mas este risco é muito maior tenham 10% de ineficácia, mas este risco é muito maior quando eles não são usados; então o risco é de 100 % . É por esta razão que recomendamos o preservativo. Um cientista, num importante jornal do Rio de Janeiro, alega que as vacinas contra o sarampo e a pólio também não imunizam 100 % . E nem por isso se pensa na possibilidade de não usá-las ou de fazer campanhas chamando a atenção para isso, sob pena de incentivar a rejeição das vacinas que praticamente erradicaram aquelas doenças. Estes argumentos parecem tão contundentes que não poucos católicos ficam perplexos. Talvez não cheguem a contradizer abertamente a posição da Igreja, mas ficam com dúvidas ou acuados ou, pelo menos, fragilizados. Esclarecimentos necessários Devemos, contudo, ponderar que a Igreja – a única instituição duas vezes milenar – tem razões muito sérias para recomendar que não se usem os preservativos. Falando-lhes como um irmão – preocupado como estou – que se deteve a estudar esse assunto em profundidade, a fim trazer-lhes um posicionamento seguro a respeito destes questionamentos, quero dizer-lhes que a argumentação antes apresentada – que compara as falhas do preservativo com as das vacinas do sarampo, ou da pólio, por exemplo – não é consistente, por duas razões: a primeira, porque os vírus da pólio e do sarampo não se podem evitar: atacam em qualquer momento, transmitem-se pelo ar que se respira, pela água que se bebe, pelo alimento que se come ou pelo contato habitual do relacionamento social ... A Aids, não: transmite-se fundamentalmente pelas relações sexuais. E ninguém é obrigado a praticá-las com uma pessoa que não se conhece em profundidade, da mesma maneira que se é obrigado a comer, a beber, a respirar ou a relacionar-se socialmente ... A segunda, porque, no caso dos preservativos, a propaganda recomenda o uso como se as relações promíscuas fossem “normais”, inócuas, inevitáveis, ou até recomendáveis. Essa é a feição que têm as propagandas que às vezes aparecem: “aproveite o carnaval, mas use ‘camisinha’”. Aceita-se um pressuposto inadequado – a promiscuidade – e inclusive incentiva-se a mesma : “não se iniba, divirta-se, mas – cuidado! – use ‘camisinha’”. A propaganda, em geral, não faz nenhuma advertência, não entra em sutilezas, simplesmente incita a usar a “camisinha”, fomentando o que este uso traz consigo: uma relação eventual e insegura. É um meio que, sem dúvida, convida ao desregramento sexual. Desregramento sexual. Desregramento sexual este que traz consigo muitos inconvenientes: o enfraquecimento da saúde e da força da vontade, a perda de um comportamento social e profissionalmente correto, a falta de respeito à pessoa humana e, sobretudo, a infidelidade conjugal e a gravidez precoce, da qual não poucas vezes deriva o aborto. A mentalidade permissivista pode aceitar-se teoricamente, porém, quando na prática nos afetam pessoalmente, é bem diferente. Pode-se defender o “sexo livre”, mas ninguém aceita que a sua esposa, ou o seu marido, tenha relações com um terceiro. Pode-se, intelectualmente, ser favorável às relações sexuais pré-matrimoniais, mas ninguém gosta de que uma filha de quinze anos fique grávida, ou que um filho de quatorze anos seja pai. O fim bom não justifica utilizar meios perversos. Quem aceitaria montar uma escola para ensinar aos pivetes de rua a roubar sem matar ? Alguém alegaria que o fim é excelente: evitar muitas mortes. Mas os meios utilizados são péssimos. Evitar o pior não justifica consentir no que é mau. Evitar a Aids é ótimo mas fomentar a promiscuidade é péssimo. Não estaremos utilizando um inibidor para a Aids – o preservativo – que, em última análise, pode se tornar causa desta mesma doença ? Descuida-se a educação dos adolescentes para a efetividade e a vida sexual sadias, lamenta-se o uso precoce do sexo e a gravidez das adolescentes e, de repente, “a toque de caixa”, põe-se nas mãos dos menores um pacote de preservativos como que dizendo: “fique bem à vontade, a ‘camisinha’ garante”. É igual a querer pagar um incêndio com gasolina! E depois chamam de irresponsável a quem dá um grito de alerta. O “slogan” da “camisinha” que foi anunciado num conhecido programa de televisão é este: “Pecado é não usar camisinha”. É difícil inventar uma tão ardilosa falácia. “Pecado é não usar ‘camisinha’” , mas não é pecado trair a esposa, usando camisinha; não é pecado o desregramento sexual porque se usa “camisinha”; não é pecado deflorar uma menina porque se usa “camisinha”; não é pecado perverter menores incitando-os a usar “camisinha”; não é pecado desfigurar a imagem do Brasil, que tem tantos valores, apresentando-o como o país da libertinagem, das mulheres fáceis, das bacanais de carnaval ... Se uma campanha gastou tempo para inventar esta “sutileza”, o que poderemos esperar no desenvolvimento da mesma campanha? A Igreja simplesmente aconselha a ter um comportamento decente – porque, não o esqueçamos, a questão consiste em ser simplesmente decente – e deixa a liberdade para que as pessoas tomem a atitude que desejarem: não faz campanha . Não tem milhões para fazer propaganda. Não pressiona a opinião pública dessa maneira. Mas tem que suportar o peso fabuloso que representa para a opinião pública programas de televisão caríssimos. Nós perguntaríamos : quem realmente comete o pecado ? Por que esse interesse em denegrir a imagem da Igreja ? Não será por medo de que a atitude transparente dEla desperte a consciência dos cidadãos? Será necessário gastar milhões para tentar convencê-los : “Não, não há pecado quando se usa ‘camisinha’”. A Igreja não pretende admiração. A Igreja o que pretende é respeito. As ações que facilitam a propagação de uma doença são eticamente reprováveis. E os atos que desumanizam o sentido da sexualidade são igualmente reprováveis. João Paulo II assim se expressou: “ o uso dos preservativos acaba estimulando, queiramos ou não, uma prática desenfreada do sexo”. Podemos inibir-nos às vezes, queridos irmãos e irmãs, mas é preciso ter a coragem de dizer as verdades aos filhos, à sociedade e ao Estado; não existe sociedade estável sem família bem constituída; não há família bem constituída sem fidelidade conjugal; e não há fidelidade conjugal sem a educação da afetividade e do sexo, sem autocontrole. E quando não há autocontrole, o que fazer ? A OMS e o Ministério da Saúde advertem: Não é para se preocupar: use a “camisinha” ! A “camisinha” soluciona todos os problemas ... Perguntamos: a “camisinha” protege das crises conjugais, do sexo prematuro tão perturbador para tantos menores de idade, da delinqüência juvenil e das conseqüências naturais da desestruturação do lar ? Sabemos muito bem que a questão não consiste em curar os efeitos; é preciso suprimir as causas. Não se soluciona o problema profilático da água colocando um filtro em cada torneira, mas purificando a água na fonte, no reservatório. Não se encontra o remédio na “camisinha”, mas na mudança de atitude: um verdadeiro trabalho educativo no qual a Família, o Estado e a Igreja têm que envidar os mais vigorosos esforços. Não, não é com preservativos que se solucionarão os problemas do desregramento sexual, mas com um trabalho profundo que venha a colocar no lugar que merece o valor da vida, do amor, do sexo, do matrimônio e da família. E é nessa empreitada que está metida a Igreja. A Igreja não nega o óbvio. A Igreja reconhece o óbvio – a realidade – mas esforça-se por superá-la. Talvez seja a única entidade, em nível mundial, que tem a coragem de chamar as coisas pelo seu verdadeiro nome. E talvez seja por essa razão que é tão duramente criticada: a luz alegra os olhos sadios e fere os que estão doentes. O fundamento da posição da Igreja Mas, caríssimos amigos e amigas, voltemos a um ponto concreto destas nossas reflexões. Há quem diga: que tem a ver a Igreja com a eficácia técnica e profilática dos preservativos ? E nós poderíamos responder com toda a certeza: em realidade ela não tem nada que ver com isso, como não tem nada que ver com a eficácia da estreptomicina, enquanto o assunto estiver no âmbito científico. A Igreja defenderia a mesma opinião de sempre, ainda que os preservativos fossem absolutamente seguros. Com efeito, o fundamento da posição da Igreja é muito mais profundo: a mesma natureza humana. O eminente descobridor do HIV, Luc Montagnier, não se recusou a comprometer-se a fundo ao indicar como deveriam ser as campanhas contra a Aids: “são necessárias campanhas contra práticas sexuais contrárias à natureza biológica do homem. E, sobretudo, há que educar a juventude contra o risco da promiscuidade e o vagabundeio sexual” ( Luc Montagnier. “AIDS Natureza do Vírus”, em Atas da IV Reunião Internacional da AIDS, 1989, p. 52 ). Note-se que não é o Padre que fala no confessionário, mas o cientista-descobridor do HIV. A lei natural determina que existe um vínculo inseparável entre a relação sexual e a transmissão da vida. Romper artificialmente essa união – como acontece no suo do preservativo – representa uma grave infração dessa mesma lei natural. A Igreja reafirmou este princípio em repetidos documentos. Apresento aqui apenas um texto da Humanae Vitae, do Papa Paulo VI: “A doutrina da Igreja está fundamentada sobre a conexão inseparável que Deus quis e que o homem não pode alterar por sua iniciativa, entre os dois significados do ato conjugal: o significado unitivo e significado procriador” ( nº 12 ) A mesma Encíclica esclarece: “É de excluir, como o Ministério da Igreja repetidamente declarou, a esterilização direta, tanto perpétua como temporária, e tanto do homem como da mulher; é, ainda, de excluir toda ação que, ou em previsão do ato conjugal, ou durante a sua realização, ou também durante o desenvolvimento das suas conseqüências naturais, se proponha, como fim ou como meio, tornar impossível a procriação” ( nº 14 ). Não se pode mudar a ordem natural em função de uma solução imediatista e inadequada que, além de não solucionar o problema da proliferação da AIDS, propicia e incentiva a uma prática desregrada do sexo. Se a Igreja não tem porque dar um diagnóstico técnico sobre a eficácia do preservativo, contudo – como qualquer pai ou qualquer mãe – muito se importa quando se pretende enganar os seus filhos com afirmações pouco transparentes ou falaciosas. Nos artigos que têm aparecido recentemente nos jornais, infectologistas afirmam que “não conhecem qualquer estudo confirmando que o vírus da Aids passa pelos poros da camisinha”. Uma afirmação como esta só tem duas explicações: ou, por um lado, há um desconhecimento das múltiplas pesquisas verificativas existentes neste sentido ( ignorância que não se pode desculpar num verdadeiro cientista); ou, por outro, existe má fé: ocultam-se dados importantes para não tirar força a uma campanha que envolve milhões de reais, alimenta a próspera “indústria do sexo” e enriquece os laboratórios. A eficácia dos preservativos Com efeito, existem numerosos trabalhos que demonstram a ineficácia dos preservativos. A nossa conversa familiar está-se prolongando demais. Não a quero tornar mais cansativa e pesada, com uma repetição enfadonha de dezenas de pesquisas existentes nesta matéria. Por isso, pediria o seu consentimento para citar apenas alguns exemplos. “A Food and Drug Administration ( FDA ) – entidade do governo dos Estados Unidos encarregada de aprovar medicamentos, próteses, aditivos alimentares, etc. – estudou 430 marcas com 102 mil preservativos; 165 fabricados nos EUA com 38 mil preservativos e 265 marcas estrangeiras com 64 mil preservativos. O resultado da pesquisa verificou que 12% das marcas estadunidenses e 21% das estrangeiras não tinham um nível suficiente de qualidade” ( CDC . “Preservativos for prevention of sexually transmitted diseases”. MMWR. N. 37, 1988, pp. 133-134, cit. por Ernesto Aguilar – Alvarer Bay, “Campanas que matan”, ISTMO, México – DF., Março-Abril 2003, p. 35 ). “Aceitando essa taxa de defeitos, a probabilidade de falha no caso do preservativo seria de 20,8 % anuais se mantivessem relações uma vez por semana, e de 41,6% se fossem duas vezes por semana”. ( F. Guillén , I. Aguinaga, “Efectividad de los preservativos em la prevención de la infección por HIV em casais de pessoas soropositivas”. Méd. Clin. N. 105, 1995, p. 542, cit. Por Ernesto Aguilar, loc. Cit . ) . “Em 1992 o doutor Ronald F. Carey, pesquisador da FDA, introduziu microesferas de poliestireno do diâmetro do HIV em preservativos que tinham superado positivamente o teste da FDA e os submeteu a variações de pressões similares às que se produzem numa relação sexual: um terço deles perdeu entre 0,4 e 1,6 nanolitros. Numa relação sexual de dois minutos, com um preservativo que perde um nanolitro por segundo, passariam 12 mil vírus de HIV” ( Cit. Por Ernesto Aguilar Alvarez Bay, loc. Cit. ). Como se observa, a porosidade do látex pode permitir a passagem de milhares de vírus da Aids, com toda a sua carga mortífera, apenas numa breve relação. Este vírus é 450 vezes menor que o espermatozóide. O Centro de Controle de Doenças de Atlanta ( EEUU ), o que mais informações possui na luta contra a Aids, reconhece que “o uso apropriado dos preservativos em cada ato sexual pode reduzir, mas não eliminar, o risco de doenças de transmissão sexual”, e acrescenta: “a abstinência e a relação sexual com um ( a ) parceiro ( a ) mutuamente fiel e não infectado ( a ) são as únicas estratégias preventivamente totalmente eficazes”. Nestes mesmos termos, a OMS, paradoxalmente, em algum momento já afirmou que “só a abstinência ou a fidelidade recíproca perdurável entre os parceiros sexuais não infectados, elimina completamente o risco de infecção do vírus HIV” ( OMS. , 20 de janeiro de 1992, nº 17 ). Se tornássemos a ler, novamente, esta última frase, pareceria estarmos escutando um aconselhamento da Igreja. Mas não, é a própria OMS que o afirma. Criticando a Igreja, essa organização está, sem perceber, contestando afirmações feitas por ela mesma. Uma fonte da Internet subscreve: Em maio de 2003, um estudo realizado na França pelo “Instituto da Saúde e da Pesquisa Médica” põe os cabelos em pé, ao indicar que a metade dos preservativos usados se rompe ou se utiliza mal: há, portanto, segundo esse estudo, somente uns 50 % de eficácia prática dos preservativos. A eficácia teórica, realizada no laboratório em condições ideais, é bem diferente da eficácia alcançada no uso dos preservativos. Esta mesma fonte acrescenta: “Toda sociedade se fundamenta na confiança que os cidadãos têm nos responsáveis políticos, escolhidos democraticamente nas urnas, por isso mesmo, não há nada mais decepcionante que a queda dessa confiança. Confiamos em que os responsáveis políticos haverão tomado nota destes importantes estudos que se acabam de citar, para agir em conseqüência, já que não se pode brincar com a saúde dos cidadãos” ( José Javier Ávila Martinez piensaunpouco.com . ) Não se poderia aplicar esse apelo a algumas autoridades brasileiras e a certos meios de comunicação social ? Por que culpar o Cardeal López Trujillo das suas afirmações e não ao Instituto de Saúde e da Pesquisa Médica da França ? Aliás, ao me referir ao Cardeal Lopez Trujillo, acrescentarei a resposta que ele mesmo deu à BBC de Londres depois das suas declarações tão mal interpretadas, dizendo que o senhor Cardeal não apresentava provas científicas para as suas declarações. Assim se expressa Dom Alfonso: “Há muitos estudos publicados que fazem surgir dúvidas fundamentadas no que diz respeito à “segurança” do uso do preservativo. Jacques Suaudeau, doutor em Medicina, que seguiu de perto o debate e problema da Aids na África, tem um importante artigo em nosso “Lexicon” cheio de anotações bibliográficas acerca do tema. Nós recebemos também notícias de um relatório de grupos que representam 10 mil médicos que acusam o Center for Disease Control ( CDC ) nos Estados Unidos de ocultar a pesquisa do próprio governo, a qual mostrava a “ineficácia dos preservativos para prevenir a transmissão de doenças sexualmente transmissíveis”. Este informe do Catholic Family and Human Rights Institute ( um grupo em Nova York que controla os temas da ONU em relação à família e à vida ) manifesta além disso que a rejeição do CDC de reconhecer este fato “contribuiu para propagar a epidemia de doenças sexualmente transmissíveis”. Infelizmente, do equívoco da BBC se fez eco uma muito conhecida revista brasileira e aquele programa de televisão de tão grande audiência a que me referi antes. Não é só a imatura superficialidade de ambas as reportagens o que me causa espanto, mas a irresponsabilidade com que se acusa, sem provas ( aí sim é que não apresentam provas ! ), uma autoridade da Igreja digna de crédito. Poderíamos prosseguir citando dúzias de pesquisas até esgotar a sua paciência, queridos irmãos e irmãs. Depois de tudo o que foi dito, perguntamos: como é possível que um pesquisador, professor de uma renomada Universidade do Rio de Janeiro, possa afirmar que “não existe qualquer estudo mostrando que a “camisinha é ineficaz na prevenção da Aids”? Como se explica que as críticas dirigidas a quem desaconselha o uso do preservativo e propõe uma educação afetiva e sexual mais de acordo com a natureza humana tenham como uma única destinatária a Igreja Católica ? O descobridor do HIV, o Centro de Controle de Doenças de Atlanta, o “Instituto da Saúde e da Pesquisa Médica da França” não falam fundamentando-se numa norma religiosa mas, pelo contrário, baseando-se nos resultados orientados por um estudo científico sério e consciencioso. Então, como é possível dizer que a “Igreja nega o óbvio”? Não seria melhor asseverar que a Igreja afirma o que toda pessoa com um mínimo de informação e de consciência ética também afirmaria, seja esta hindu, budista, maometana, cristã ou espírita; quer seja parte do povo comum do Brasil, quer integre um governo que diz querer representar os sentimentos desse povo ? Volto a insistir em algo fundamental: a Igreja não rejeita o uso de preservativos somente porque estes não são eficazes. Continuaria afirmando o mesmo se estes fossem 100% perfeitos, em todo momento e em todas as circunstâncias. Mas, levando em conta as falhas da “camisinha”, é natural que, como faria qualquer mãe responsável, advirta aos seus filhos dos riscos que correm. Há momentos em que calar-se representa uma grave omissão. Por que faz isso o Ministério da Saúde ? Como já afirmamos em outro momento, não é transparente uma propaganda de difusão indiscriminada do uso do preservativo sem chamar a atenção sobre os seus perigos. Se todo laboratório tem a obrigação legal de indicar na bula dos remédios os efeitos colaterais do mesmo, e os fabricantes de cigarros alertar, em cada maço, as doenças que o fumo provoca, o Ministério da Saúde tem também a obrigação de prevenir a população a respeito do risco no uso dos preservativos. Coisa que ele sistematicamente não faz: fala-se sempre de “sexo seguro”. A atitude da Igreja dissemina a aids ? A Igreja não está impedindo o combate à AIDS, pelo fato de não concordar com o uso da “camisinha”. Quem afirmar o contrário está difundindo uma inverdade insidiosa que muitos aceitam passivamente sem ulteriores verificações. Como uma pequena mostra disto que acabo de afirmar, copio um artigo de ISTMO, uma conhecida e prestigiosa revista cultural mexicana – não de uma revista religiosa – escrita por um especialista na matéria e não por um moralista. “Se analisarmos a Aids na África, devemos pensar que a influência da Igreja Católica se circunscreve a 15,6 % da sua população total. Alguém se atreveria a afirmar que a Aids prejudica em maior medida os católicos do que os muçulmanos ou animistas? Não seria possível fazer isto, já que diversas estatísticas demonstram que a comunidade católica sofre em medida bem menor a praga da Aids: é lógico que o ensinamento em favor da monogamia e da castidade tenham os seus efeitos positivos em ambiente de promiscuidade generalizada. “Então entre que grupos humanos a atitude da Igreja poderia contribuir para disseminar Aids ? Entre os católicos sem prática religiosa, nem vivência dos seus princípios morais ? Seria sensato supor que quem é infiel à sua esposa virá a respeitar a orientação da Igreja que desaconselha o uso do preservativo ? Nestas condições correria, por acaso, o risco de contaminar-se para ser fiel às orientações de uma religião que não pratica ? Seria um absurdo. Evidentemente que quem não tem escrúpulos de ter relações com uma mulher fácil ou uma prostituta, nem se apresentará a questão da licitude moral do preservativo. Portanto, acusar a Igreja Católica na difusão da Aids por esse motivo é, mais do que um absurdo, uma manobra para negar-se a reconhecer a realidade contrária: sem a moral católica a sociedade seria mais promíscua e, em conseqüência, a Aids, estaria muito mais estendida” ( Ernesto Aquilez – Alvarez Bay. “Istmo”. México, DF, Março a Abril de 2003, p. 38 ) The Wall Street Journal, em 14 de outubro último, fez constar que 25% dos doentes da Aids no mundo são atendidos por instituições católicas. E, igualmente, afirmou que os estudos científicos – um deles a cargo do Serviço de Saúde dos Estados Unidos e outro de responsabilidade da Universidade de Harvard – coincidiam em alertar sobre os decepcionantes resultados da prevenção da Aids baseados no preservativo. Menciona-se o caso de Uganda que, em 1991, contava com uma taxa de infecção de 20%, enquanto que, no ano de 2002, tinha descido aos 6%, em virtude de uma política sanitária centrada na fidelidade e na abstinência, não no preservativo ( grifo nosso ) ( à diferença de Botsuana e Zimbábue, que ainda ocupam os primeiros lugares nos contágios ) ( Aciprensa. Madrid, 22 de outubro 2003, p. 3 ). Chama a atenção que estes fatos sejam sistematicamente silenciados. Por baixo das realidades verdadeiramente científicas desliza uma correnteza estranha e anticientífica que silencia estas realidades positivas. A agência LifeSite e a agência ACI , por exemplo, denunciaram recentemente que a maioria dos informes sobre a Aids na África ignoram sempre os êxitos conseguidos em Uganda, por haver apostado na sua política sanitária, na promoção da abstinência sexual, da fidelidade e da castidade. Muitas autoridades, incluindo o Secretário de Estado norte-americano Colin Powell, louvaram e reconheceram o êxito de Uganda em reduzir a taxa de infecção uns 50% desde 1992. Inclusive a CNN informou que, no ano 2000, foi o país “com maior sucesso na luta contra a Aids”. No entanto, a LifeSite adverte que por uma razão desconhecida “o êxito de Uganda poucas vezes é mencionado” ( VII Congresso Nacional sobre el SIDA, maio de 2003, Bilbao, Espanha ). Questiono-me sobre se essas razões, desconhecidas e estranhas, são as que fazem alguns cientistas brasileiros dizerem que “desconhecem a existência de pesquisas sobre falhas nos preservativos” e os levam a formular críticas maldosas dizendo que a Igreja “desconhece a realidade” e “nega o óbvio”. O jornal espanhol La Gaceta de los Negócios ( 16/12/02 ) comenta nesse sentido: “os patrocinadores do preservativo como principal instrumento de prevenção da Aids, em lugar de aceitar esta evidência – o grande sucesso de Uganda – se obstinam nas políticas de extensão do uso do preservativo, que leva inevitavelmente consigo o implícito convite à promiscuidade sexual sob a mentirosa promessa do ‘sexo seguro’. O resultado é o que temos diante dos olhos. Há loucos dispostos a tudo antes de propor o domínio sobre as paixões”. A afirmação está feita por um jornal comercial, não por um boletim paroquial. O governo Bush procura, agora, incorporar um treinamento de abstinência ao Programa Internacional Americano para a AIDS. Este plano questiona a efetiva prevenção da Aids por preservativos. ( LifeSite Daily News Lsn@lifesite.net ) . Há evidentes realidades de que o chamado “sexo seguro” não tem contido a expansão da doença. Por exemplo, conduzida por Nelson Mandela, a África do Sul abraçou firmemente a estratégia do “sexo seguro”, e o uso de preservativo aumentou. Mas a África do Sul continua a liderar mundialmente os casos de infecção por Aids com 11,4 % de sua população atualmente infestada. Há notícias de Mercury News de Miami de que a Fundação Bill e Melinda Gates gastarão US$ 28 milhões para estudar o potencial dos preservativos no controle da natalidade e no combate à Aids na África. Porém, as mesmas notícias do Mercury News acautelam que : “As bases científicas para a prevenção da Aids através de preservativos são mais teóricas que clinicamente provadas” ( LifeSite Daily News Lsn@lifesite.net ) . Insistimos: não entendemos como, depois de tantos questionamentos de tão alto nível, algum professor universitário brasileiro ou algum representante do Ministério da Saúde afirmem, sem fazer nenhuma ressalva, “ a segurança absoluta dos preservativos”. Perguntamos reiteradamente: é ignorância ou uma versão nova da “conspiração do silêncio” ? A solícita preocupação da Igreja com a Aids Não podemos deixar de notar que a Igreja preocupa-se extraordinariamente com a Aids. Mais ainda, é uma das entidades que, de uma maneira mais efetiva, luta contra a Aids. O Cardeal Cláudio Humes, chefe da delegação da Santa Sé na ONU, em 22 de setembro de 2003, também proclamou que “ a Santa Sé, graças as suas instituições no mundo inteiro, provê 25% da atenção total que se dá às vítimas do HIV/Aids, e assim ela se situa entre os principais atores nessa matéria, particularmente entre os mais assíduos e melhores provedores de atenção às vítimas ( “Intervenção de Sua Eminência Cardeal Cláudio Hummes, Chefe da Delegação da Santa Sé na Reunião Plenária de Alto Nível da Assembléia Geral Dedicada ao Segmento dos Resultados do Vigésimo Sexto Período Extraordinário de Sessões”. ONU, Nova York, 22 de setembro de 2003. ). A Igreja no Brasil já assumiu o serviço de prevenção do HIV e da assistência a soro-positivos e, sem preconceitos, acolhe, acompanha e defende o direito à assistência médica e gratuita daquelas e daqueles que foram infectados pero vírus da Aids. Faz também um trabalho de prevenção pela conscientização dos valores evangélicos, sendo presença misericordiosa e promovendo a vida como bem maior ( Cf. Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil , nº 123 – Doc. 71, 2003 ) . Evidentemente, ninguém dedicaria tamanho esforço para atender solicitamente e curar, na medido do possível, os doentes da Aids, e, ao mesmo tempo, estivesse facilitando a propagação da mesma doença de uma maneira irresponsável, como maldosamente já disse ultimamente algum meio de comunicação. Em todas as questões é preciso olhar, de diferentes ângulos, para todas as facetas de um problema a fim de obter a respeito dele um diagnóstico equilibrado e certeiro. Este critério não é certamente o que seguem os que estão criticando a Igreja agora por desaconselhar o uso do preservativo. O programa de distribuição de preservativos Capítulo à parte constitui o programa de distribuição de preservativos iniciado pelos Ministérios da Saúde e da Educação. Pretendem entregar cerca de 235 milhões de preservativos, por ano, para 2 milhões e meio de estudantes das escolas fundamentais. Volto a repetir o que já disse em outro lugar. No âmbito de uma população estudantil formada de adolescentes, o perigo de que a propaganda de distribuição de preservativos venha a ser um incentivo para a prática do sexo precoce é algo claro e evidente de per si. Porque, sob a capa de evitar uma doença, parece que, subliminarmente, se está insinuando com uma a pedagogia indireta : “Transar, não há nada demais”. “Se você sente esse impulso, por que não satisfazê-lo ? O importante – isto sim ! – é usar a “camisinha””. E isto, porventura, é o mais importante para um pai e uma mãe responsáveis ? Que pai responsável pensa: se minha filha se deita com qualquer coleguinha para se divertirem não tem importância, o que tem importância é que não se esqueçam de usar a “camisinha”? Por outro lado, sendo a educação afetiva e sexual uma tarefa que compete primordialmente aos pais, a propaganda maciça, iniludível e impositiva sobre o uso dos preservativos entre menores significa uma interferência abusiva num direito inalienável do pátrio poder. Poder-se-ia também questionar que os pais não estão preparados para oferecer uma educação afetiva e sexual aos filhos. Isto, porém, não deve levá-los à culpável omissão de relegar obrigação tão grave a uma orientação impessoal e massiva que, pelo que se observa, também não está preparada para transmiti-la. São os pais que devem, com responsabilidade própria e intransferível, ir, gradativamente, adquirindo esses conhecimentos para passá-los , na sua devida hora, aos seus filhos. Essa tarefa faz toda mãe responsável a respeito da alimentação, dos cuidados da puericultura, de higiene e dessa função tão importante como é a de discernir entre o certo e o errado, sem necessidade de fazer estudos especializados. É uma questão de interesse, de prioridades. Não se pode alienar direitos que são deveres. O Estado não pode instigar a um tipo de educação sexual sem abrir opções aos pais para que possam escolher, com liberdade, entre uma solução ou outra. Será que as autoridades públicas dão às Igrejas e outras instituições não governamentais – formadas por cidadãos brasileiros – de modo proporcional, os recursos educacionais semelhantes aos que o governo, unilateralmente, gasta em um programa milionário como a campanha dos preservativos ? Neste terreno, o caráter subsidiário do Estado na educação dos filhos deveria oferecer a estas instituições esses recursos, a fim de que os pais venham a dispor de novas perspectivas e opções. Para nós não cabe a menor dúvida de que um programa de distribuição massiva de “camisinhas” pode ser o estopim para desencadear um novo processo de perversão de menores, paradoxalmente amparado por lei. Conclusão Finalizando a nossa conversa, caríssimos irmãos e irmãs, reconheço que a minha confidência foi longa demais. Entretanto, estendi-me bem além do que desejaria, pensando em que vocês, apoiando-se nessas idéias, poderiam transmiti-las em seu primeiro lugar dentro do seu âmbito familiar e, depois, fora dele, a outros, e estes, por sua vez, a outros, em ondas sucessivas – como a pedra que cai no lago formando círculos concêntricos cada vez mais amplos – para que a verdade a respeito da Doutrina da Igreja fique no seu verdadeiro lugar e se expanda com os seus benéficos efeitos a toda pessoa e lugar. Penso que é anseio de todos nós que estas verdades não se detenham no nosso reduzido círculo, mas que se espalhem com toda a força e a ressonância de que estão dotadas. Não é minha intenção fomentar um conflito entre as autoridades governamentais, a Igreja e a instituição familiar. Pelo contrário, tento harmonizar o desejo inegável, de reconhecido valor, do Estado de evitar a propagação da AIDS, com os direitos e deveres da Igreja na transmissão de sua Doutrina e com os direitos e deveres das famílias de serem devidamente informadas e de fazerem valer as suas prerrogativas no que diz respeito à educação sexual dos seus filhos. Tomara que estas considerações de alguma forma para que se estabeleça um diálogo respeitoso, construtivo e enriquecedor entre o Estado, a Igreja e as famílias. Nós amamos a Igreja – nossa Mãe – e a nossa família – Igreja doméstica. Esse amor deve levar-nos a protegê-las dos ataques feitos, muitas vezes por ignorância e outras por intenções escusas e menos nobres. Foi por isso que a minha conversa se alongou demais: pude alargar o coração, em confidência de irmão, ou de pai, ao lado de vocês, em quem por constituírem a minha família, confio ilimitadamente. Brasília , 12 de novembro de 2003. Dom Rafael Llano Cifuentes Bispo Auxiliar da Arquidiocese do Rio e Presidente da Comissão Família e Vida da CNBB Nota: Dom Rafael fez acompanhar esta carta da citação de inúmeras pesquisas, que não puderam ser publicadas nesta edição. As mesmas podem ser acessadas na página da CNBB, na internet: www.cnbb.org.br Carta publicada no órgão oficial da Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro , O Testemunho da Fé , ano XII ( III ) – nº 306 – edição semanal nº 154 – de 21 a 27 de dezembro/2003, pp. 4-5.

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