Queridos irmãos e irmãs!
(...)
É fundamental para a nossa fé e para o nosso testemunho cristão proclamar a ressurreição de Jesus de Nazaré como acontecimento real, histórico, confirmado por muitas e respeitáveis testemunhas. Afirmámo-lo com vigor porque, também neste nosso tempo, não falta quem procura negar a sua historicidade reduzindo a narração evangélica a um mito, a uma "visão" dos Apóstolos, retomando e apresentando antigas e já consumadas teorias como novas e científicas. Certamente a ressurreição não foi para Jesus um simples regresso à vida precedente. Neste caso, de facto, teria sido uma coisa do passado: há dois mil anos alguém ressuscitou, voltou à sua vida precedente, como por exemplo Lázaro. A ressurreição situa-se noutra dimensão: é a passagem para uma dimensão de vida profundamente nova, que diz respeito também a nós, que envolve toda a família humana, a história e o universo. Este acontecimento que introduziu uma nova dimensão de vida, uma abertura deste nosso mundo à vida eterna, mudou a existência das testemunhas oculares como demonstram as narrações evangélicas e os outros escritos neotestamentários; é um anúncio que inteiras gerações de homens e mulheres ao longo dos séculos receberam com fé e testemunharam com frequência com o preço do seu sangue, sabendo que precisamente assim entravam nesta nova dimensão da vida. Também este ano, na Páscoa ressoa inalterada e sempre nova, em todos os recantos da terra, esta boa notícia: Jesus morto na cruz ressuscitou, vive glorioso porque derrotou o poder da morte, levou o ser humano a uma comunhão nova de vida com Deus e em Deus. Esta é a vitória da Páscoa, a nossa salvação! Podemos, portanto, cantar com Santo Agostinho: "A ressurreição de Cristo é a nossa esperança", porque nos introduz num futuro novo.
É verdade: a ressurreição de Jesus funda a nossa firme esperança e ilumina toda a nossa peregrinação terrena, inclusive o enigma humano do sofrimento e da morte. A fé em Cristo crucificado e ressuscitado é o âmago de toda a mensagem evangélica, o núcleo do nosso "Credo". Deste "Credo" essencial podemos encontrar uma expressão autorizada num conhecido trecho paulino, contido na Primeira Carta aos Coríntios (15, 3-8) no qual, o Apóstolo, para responder a alguns da comunidade de Corinto que paradoxalmente proclamavam a ressurreição de Jesus mas negavam a dos mortos – a nossa esperança – transmite fielmente o que ele – Paulo – tinha recebido da primeira comunidade apostólica sobre a morte e ressurreição do Senhor.
Ele inicia com uma afirmação quase peremptória: "Lembro-vos, irmãos, o Evangelho que vos anunciei, o qual recebestes e no qual perseverais. Por ele sereis salvos, se o tiverdes como vo-lo transmiti; de outra forma, tereis acreditado em vão" (vv. 1-2). Acrescenta imediatamente que lhes transmitiu o que ele mesmo tinha recebido. Segue depois a perícope que ouvimos no início deste nosso encontro. São Paulo apresenta antes de tudo a morte de Jesus e coloca, num texto tão pobre, dois complementos à notícia de que "Cristo morreu". O primeiro é: morreu "pelos nosso pecados"; e o seguinte: "segundo as Escrituras" (v. 3). Esta expressão "segundo as Escrituras" coloca o acontecimento da morte do Senhor em relação com a história da aliança veterotestamentária de Deus com o seu povo, e faz-nos compreender que a morte do Filho de Deus pertence ao tecido da história da salvação, e aliás, faz-nos compreender que esta história recebe dela a sua lógica e o seu verdadeiro significado. Até àquele momento a morte de Cristo tinha permanecido quase um enigma, cujo êxito ainda era incerto. No mistério pascal cumprem-se as palavras da Escritura, isto é, esta morte realizada "segundo as Escrituras" é um acontecimento que tem em si o logos, uma lógica: a morte de Cristo testemunha que a Palavra de Deus se fez totalmente "carne", "história" humana. Compreende-se, de outro acréscimo feito por Paulo, o como e o porquê isto aconteceu: Cristo morreu "pelos nosso pecados". Com estas palavras o texto paulino parece retomar a profecia de Isaías contida no Quarto Canto do Servo de Deus (cf. Is 53, 12). O Servo de Deus – assim diz o Canto – "despojou-se até à morte", carregou "os pecados de muitos", e intercedendo pelos "culpados" pôde proporcionar o dom da reconciliação dos homens entre si e dos homens com Deus: a sua é portanto uma morte que põe fim à morte; o caminho da Cruz leva à Ressurreição.
Nos versículos que seguem, o Apóstolo detém-se depois sobre a ressurreição do Senhor. Ele diz que Cristo "ressuscitou no terceiro dia segundo as Escrituras". De novo: "segundo as Escrituras"! Não poucos exegetas entrevêem na expressão: "ressuscitou no terceiro dia segundo as Escrituras" uma significativa referência a quanto lemos no Salmo 16, no qual o Salmista proclama: "Vós não me entregareis à mansão dos mortos, nem deixareis que o Vosso amigo veja o sepulcro" (v. 10). Este é um dos textos do Antigo Testamento, citados com frequência no cristianismo primitivo, para provar o carácter messiânico de Jesus. Dado que segundo a interpretação judaica a corrupção começava depois do terceiro dia, a palavra da Escritura cumpre-se em Jesus que ressuscitou no terceiro dia, isto é, antes que comece a corrupção. São Paulo, ao transmitir fielmente o ensinamento dos apóstolos, ressalta que a vitória de Cristo sobre a morte acontece através do poder criador da Palavra de Deus. Este poder divino dá esperança e alegria: é este definitivamente o conteúdo libertador da revelação pascal. Na Páscoa, Deus revela-se a Si mesmo e ao poder do amor trinitário que destrói as forças destruidoras do mal e da morte.
Queridos irmãos e irmãs, deixemo-nos iluminar pelo esplendor do Senhor ressuscitado. Acolhamo-lo com fé e aderamos generosamente ao seu Evangelho, como fizeram as testemunhas privilegiadas da sua ressurreição; como fez, alguns anos mais tarde, São Paulo que encontrou o Mestre divino de modo extraordinário no caminho de Damasco. Não podemos conservar só para nós o anúncio desta Verdade que muda a vida de todos. E com humilde confiança rezamos: "Jesus, que ao ressuscitar dos mortos antecipastes a nossa ressurreição, nós cremos em Ti!". Apraz-me concluir com uma exclamação que Silvano de Monte Athos gostava de repetir: "Rejubila, ó minha alma. É sempre Páscoa, porque Cristo ressuscitado é a nossa ressurreição!". Que a Virgem Maria nos ajude a cultivar em nós, e à nossa volta, este clima de alegria pascal, para sermos testemunhas do Amor divino em cada situação da nossa existência. Mais uma vez, Boa Páscoa a todos vós!
PAPA BENTO XVI AUDIÊNCIA GERAL
Praça de São Pedro
Quarta-feira, 15 de Abril de 2009
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