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Ciência e fé: mal-entendidos



Num dia desses tirei um tempinho para assistir a alguns vídeos no YouTube com discussões sobre filosofia, ciência e , bem como sobre criacionismo evolucionismo. Fiquei impressionado com os mal-entendidos e conceitos truncados, imprecisos e incompletos, além de puros e simples preconceitos! Não é à toa que muitos pensam que fé e ciência sejam incompatíveis! Com determinadas visões de ciência e certas visões de fé, não é para menos!


Resumidamente, como este espaço permite, é preciso que se compreenda o seguinte: (1) Não há contraposição entre criacionismo e evolucionismo do ponto de vista bíblico. (2) Desde os anos 50 do século passado a Igreja tem deixado claro que as narrativas bíblicas da criação pertencem a um gênero literário poético: Deus criou tudo, tudo é bom, tudo foi tirado do nada para a glória de Deus, a misteriosa realidade do mal é fruto de um não a Deus dado pela criatura, o homem é imagem de Deus, tudo caminha para Deus. É isto que os relatos da criação desejam ensinar. (3) Há um tremendo mal-entendido de muitos cientistas sobre o que significa a palavra Deus bem como sobre o Seu modo de agir!

Deus não é um ser entre outros, que possa ser apreendido, descrito, "quantificável". Ele é o Ser; rigorosamente falando, Ele não existe; Ele É! É presente no mais íntimo da menor e mais fugaz partícula subatômica e envolve o universo todo (ou milhares de outros que possam existir, segundo a imaginação mais fantasiosa que real de alguns astrofísicos...): Ele é o mais Além e o mais Aquém de tudo! Sobre Deus, a ciência não tem nada a dizer, simplesmente porque Ele escapa totalmente ao seu campo de estudo e competência. Fico impressionando quando vejo cientistas que, falando de Deus, de repente extrapolam seu campo e tornam-se filósofos ou teólogos de má qualidade...

Outro mal-entendido: o modo de pensar a ação de Deus no mundo. Dou alguns exemplos: se é a liberdade humana quem age, então não é Deus; se é Deus, então não é a liberdade. Assim, para libertar o homem, é necessário eliminar Deus. Outro exemplo: se se consegue explicar os dinamismos da matéria, da energia, a evolução do universo e a evolução dos seres vivos, então Deus não existe... Aí aparecem com toda força a compreensão tortíssima de quem é Deus e da qualidade da Sua ação! Exatamente porque Deus não é um ser entre os seres, mas é o Ser que cria soberanamente e sustenta continuamente tudo no ser, Sua ação criadora é contínua e total e não vem de fora para dentro do mundo criado, mas age no íntimo mesmo da matéria e da vida. Assim, uma flor se abre porque Deus continua criando, uma estrela explode porque Deus continua agindo, o vento sopra porque Deus continua Sua obra! Mas, e as leias da natureza? São obra contínua de Deus, que é amorosamente fiel à Sua criação! A evolução mesma é obra da contínua e perene ação de Deus, que tudo dirige, governa e conduz segundo Sua misteriosa sabedoria, que nos ultrapassa!

Então, isto significa que não se pode perceber os rastros de Deus na Criação? Pode-se sim! (1) O próprio fato de existir o ser e não o nada, grita pela questão: donde vem tudo? Quem deu a tudo o ser e a consistência? E esta incrível ordem, mesmo em áreas de aparente desordem? Como do nada pôde surgir tudo? Nenhum cientista tem uma resposta científica para tais questões. Os que se metem a respondê-las extrapolam o método científico e começam a fazer filosofia, na maioria das vezes, de má qualidade...

(2) Se pensarmos bem, olhando a criação e a inteligência e o coração humanos, temos que nos perguntar por uma Inteligência infinita, que nos ultrapassa totalmente e tudo criou para Si! O mal é querer medir Deus por nós, engaiolando-O no nosso estreito limite! (3) Mas, tem mais: quantas vezes diante da beleza da criação e da vida com seus acontecimentos, temos a intuição fortíssima da existência e da presença desse Criador amoroso, verdadeiro poeta? Reduzir o conhecimento humano ao racional é ridiculamente desumano! Até mesmo descobertas científicas são realizadas, às vezes, seguindo-se a intuição... E é bom ter bem presente que no caso da persistente intuição que o coração e a inteligência humana têm da existência de Deus, não se trata de um tema periférico da vida, mas do fundamento mesmo da existência. Trata-se de uma intuição que poderíamos chamar de arquetípica, ponto de o homem não conseguir jamais escapar da noção de Deus – a não ser para cair na noção de deuses falsos, verdadeiras armadilhas que tiranizam e desfiguram o homem!

(4) E o mais que tudo: a tremenda e perturbadora questão do Sentido! Por que e para que tudo existe? E eu, com meus sonhos e desejos infinitos? E a inteligência e consciência do ser humano? Não será a neurociência ou qualquer outro ramo da ciência que poderá responder a este tipo de perguntas. Aqui entra a filosofia e, em última análise, a religião!

A discussão entre fé e razão, entre ciência e religião sempre foi muito problemática devido às intolerâncias e preconceitos de ambas as partes. Atualmente, pelo menos na nossa cultura ocidental, o grande preconceito e intolerância parte, sobretudo, da visão estreita de alguns cientistas. Seria preciso humildade para escutar o outro, para perceber os vários campos de abordagem da realidade, aceitando os limites do seu próprio campo de estudo. Se se levasse isso em conta, haveria bem menos mal-entendidos e bem menos bobagem nas opiniões sobre o tema...

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