Nesta entrevista, o Dr. Stanley Jaki – autoridade mundialmente reconhecida em História e Filosofia da Ciência – fala sobre as relações (nem sempre pacíficas) entre o trabalho científico e as questões filosóficas e religiosas que estão na base de toda a Ciência.
Dr. Jaki, o senhor afirmou que em todas as salas de aula e em todos os laboratórios deveria estar gravada a frase de Maxwell (1): “Uma das provas mais difíceis para uma mente científica é conhecer os limites do método científico”. Que limites são esses
Os limites da Ciência (e ao falar Ciência refiro-me à sua forma mais exata, a Física) são fixados pelo seu próprio método. O método da Física versa sobre os aspectos quantitativos das coisas em movimento. Só podemos aplicar legitimamente o método da Física quando captamos aspectos quantitativos das coisas. Mas se diante das coisas surgem questões como “Isso é bonito?” ou “Isso existe?” ou “Isso é moralmente bom?”, então estamos fazendo perguntas que o método da Física não permite responder. Hoje em dia – quando muitos desejam respostas científicas para as suas perguntas – é muito importante que essa limitação do método científico seja manifestada com clareza por físicos de renome.
Os físicos têm uma grande autoridade epistemológica. Qualquer coisa dita por um Prêmio Nobel de Física, mesmo que não esteja relacionada com o seu campo específico de estudo, logo aparece publicada pela imprensa: ele pode falar dos assuntos mais variados, e até dizer bobagens. Não importa o que diga, é mais fácil ver as pessoas duvidarem de si mesmas antes de duvidarem de um Prêmio Nobel de Física. Alguns físicos têm abusado muito da confiança que as pessoas depositam neles. De qualquer modo – e tendo em vista que esses abusos acabaram tornando-se coisa de rotina –, descobrimos uma pista que nos leva a um dos maiores males da cultura Ocidental contemporânea: um interesse quase exclusivo por quantidades. Virou moda recorrer às estatísticas para analisar questões morais: quantos agem desta maneira e quantos agem daquela outra? Depois – nos raros casos em que se chega a alguma conclusão –, afirma se que é preferível agir conforme a maioria.
Em outras palavras, o perigo “potencial” que existe no método científico é o de que sob a sua influência podemos acabar quadriculando a nossa sensibilidade em padrões previamente fixados. Já que um padrão pode ser medido, podemos cair na tentação de pensar que encontraremos a resposta para uma dada pergunta tão logo obtivermos certos resultados quantitativos. Agindo assim, é possível que estejamos eliminando justamente os aspectos mais interessantes da própria pergunta, especialmente se ela for uma pergunta estética, moral ou sobre a existência de algo.
Um cientista observa, por exemplo, uma amostra no seu microscópio. Ao fazê-lo, aplica legitimamente o método científico. Mas esse método não pode garantir-lhe nem mesmo o simples fato de que o microscópio existe e está diante dele. Ponho ênfase nos verbos existir, estar e ser, pois são os mais metafísicos de todos os verbos: o método da Ciência não sabe lidar com eles.
O senhor afirmou que o grande “crime” da nossa época é dizer que o único conhecimento verdadeiro é aquele que pode ser medido quantitativamente. Quais são as principais conseqüências desse “crime”?
É um crime no sentido de que essas aplicações unilaterais do método quantitativo privam o ser humano da sua sensibilidade para aspectos incomensuráveis da existência. A principal conseqüência é a relativização dos pontos de vista morais. Em vez de nos movermos numa perspectiva moral – segundo a qual uma ação é intrinsecamente boa, ao passo que outra é intrinsecamente má –, caminhamos segundo um modelo behaviorista. Essa é a base do relativismo moderno, fundamentado na crença de que existem vários padrões de comportamento válidos (ou, como se diz na popular expressão americana, vários “estilos de vida alternativos”). A partir daí, já não se fazem mais perguntas.
Entrevista com o Dr. Stanley Jaki publicada no site da Editora Quadrante
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