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A DIGNIDADE DA MULHER E SUA VOCAÇÃO

CARTA APOSTÓLICA MULIERIS DIGNITATEM DO SUMO PONTÍFICE JOÃO PAULO II SOBRE A DIGNIDADE E A VOCAÇÃO DA MULHER POR OCASIÃO DO ANO MARIANO

Veneráveis Irmãos e caríssimos Filhos e Filhas, saúde e Bênção Apostólica!

INTRODUÇÃO

Um sinal dos tempos

1. A DIGNIDADE DA MULHER e a sua vocação — objeto constante de reflexão humana e cristã — têm assumido, em anos recentes, um relevo todo especial. Isso é demonstrado, entre outras coisas, pelas intervenções do Magistério da Igreja, refletidas nos vários documentos do Concílio Vaticano II, que afirma em sua Mensagem final: « Mas a hora vem, a hora chegou, em que a vocação da mulher se realiza em plenitude, a hora em que a mulher adquire no mundo uma influência, um alcance, um poder jamais alcançados até agora. Por isso, no momento em que a humanidade conhece uma mudança tão profunda, as mulheres iluminadas do espírito do Evangelho tanto podem ajudar para que a humanidade não decaia ».(1) As palavras desta Mensagem retomam o que já fora expresso no Magistério conciliar, especialmente na Constituição pastoral Gaudium et Spes (2) e no Decreto sobre o apostolado dos leigos, Apostolicam Actuositatem.(3)

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Num de seus Discursos, o Papa Paulo VI declarou, entre outras coisas « No cristianismo, de fato, mais que em qualquer outra religião, a mulher tem, desde as origens, um estatuto especial de dignidade, do qual o Novo Testamento nos atesta não poucos e não pequenos aspectos (...); aparece com evidência que a mulher é destinada a fazer parte da estrutura viva e operante do cristianismo de modo tão relevante, que talvez ainda não tenham sido enucleadas todas as suas virtualidades ».

Os Padres da recente Assembléia do Sínodo dos Bispos (Outubro de 1987), dedicada à « vocação e missão dos leigos na Igreja e no mundo vinte anos após o Concílio Vaticano II », voltaram a ocupar-se da dignidade e da vocação da mulher. Auspiciaram, entre outras coisas, o aprofundamento dos fundamentos antropológicos e teológicos necessários para resolver os problemas relativos ao significado e à dignidade do ser mulher e do ser homem. Trata-se de compreender a razão e as consequências da decisão do Criador de fazer existir o ser humano sempre e somente como mulher e como homem. Somente a partir destes fundamentos, que consentem colher em profundidade a dignidade e a vocação da mulher, é possível falar da sua presença ativa na Igreja e na sociedade.

É disso que entendo tratar no presente Documento. A Exortação pós-sinodal, a ser publicada a seguir, apresentará as propostas de índole pastoral relativas ao lugar da mulher na Igreja e na sociedade, sobre as quais os Padres sinodais teceram importantes considerações, tendo avaliado também os testemunhos dos Auditores leigos — mulheres e homens — provenientes das Igrejas particulares de todos os continentes.

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Consciência de uma missão

30. A dignidade da mulher está intimamente ligada com o amor que ela recebe pelo próprio fato da sua feminilidade e também com o amor que ela, por sua vez, doa. Confirma-se assim a verdade sobre a pessoa e sobre o amor. Acerca da verdade da pessoa, deve-se uma vez mais recorrer ao Concílio Vaticano II: « O homem, a única criatura na terra que Deus quis por si mesma, não pode se encontrar plenamente senão por um dom sincero de si mesmo ». (59) Isto se refere a todo homem, como pessoa criada à imagem de Deus, quer homem quer mulher. A afirmação de natureza ontológica aqui contida está a indicar também a dimensão ética da vocação da pessoa. A mulher não pode se encontrar a si mesma senão doando amor aos outros.

Desde o « princípio » a mulher — como o homem — foi criada e «colocada» por Deus precisamente nesta ordem de amor. O pecado das origens não anulou esta ordem, não a apagou de modo irreversível. Provam-no as palavras bíblicas do Proto-Evangelho (cf. Gen 3, 15). Nas presentes reflexões observamos o lugar singular da « mulher » nesse texto chave da Revelação.

Se a dignidade da mulher testemunha o amor que ela recebe para, por sua vez, amar, o paradigma bíblico da « mulher » parece desvelar também qual seja a verdadeira ordem do amor que constitui a vocação da mesma mulher. Trata-se aqui da vocação no seu significado fundamental, pode-se dizer universal, que depois se concretiza e se exprime nas múltiplas « vocações » da mulher na Igreja e no mundo.

A força moral da mulher, a sua força espiritual une-se à consciência de que Deus lhe confia de uma maneira especial o bomem, o ser humano. Naturalmente, Deus confia todo homem a todos e a cada um. Todavia, este ato de confiar refere-se de modo especial à mulher — precisamente pelo fato da sua feminilidade — e isso decide particularmente da sua vocação.

Inspirando-se nesta consciência e neste ato de confiança, a força moral da mulher exprime-se em numerosíssimas figuras femininas do Antigo Testamento, do tempo de Cristo, das épocas sucessivas, até aos nossos dias.

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Na nossa época, os sucessos da ciência e da técnica consentem alcançar, num grau até agora desconhecido, um bem-estar material que, enquanto favorece alguns, conduz outros à marginalização. Desse modo, este progresso unilateral pode comportar também um gradual desaparecimento da sensibilidade pelo homem, por aquilo que é essencialmente humano. Neste sentido, sobretudo os nossos dias aguardam a manifestação daquele « gênio » da mulher que assegure a sensibilidade pelo homem em toda circunstância: pelo fato de ser homem! E porque a maior é a caridade » (cf. 1 Cor 13, 13).

Portanto, uma leitura atenta do paradigma bíblico da « mulher » — desde o Livro do Gênesis até ao Apocalipse — confirma em que consistem a dignidade e a vocação da mulher e o que nelas é imutável e não se desatualiza, tendo o seu « fundamento último em Cristo, o mesmo ontem, hoje e por toda a eternidade ». (61) Se o homem é por Deus confiado de modo especial à mulher, isto não significará talvez que Cristo espera dela a realização do « sacerdócio real » (1 Pdr 2, 9), que é a riqueza que ele deu aos homens? Esta mesma herança Cristo, sumo e único sacerdote da nova e eterna Aliança e Esposo da Igreja, não cessa de submeter ao Pai, mediante o Espírito Santo, para que Deus seja « tudo em todos » (1 Cor 15, 28). (62)

Então chegará ao cumprimento definitivo a verdade que « maior é a caridade » (cf. 1 Cor 13, 13).

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Fonte: Vatican.va

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