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A VERDADEIRA LIBERDADE PRESSUPÕE A BUSCA DA VERDADE

(...)
Hoje, de maneira especial no meio dos jovens, sobressai de novo a interrogação a respeito da natureza da liberdade conquistada. Para qual finalidade se vive em liberdade? Quais são as suas autênticas características distintivas?


Cada geração tem a tarefa de se comprometer desde o início na árdua procura do modo como ordenar correctamente as realidades humanas, esforçando-se por compreender o recto uso da liberdade (cf. Spe salvi, 25). O dever de revigorar as "estruturas de liberdade" é fundamental, mas nunca é suficiente: as aspirações humanas elevam-se acima de nós mesmos, para além daquilo que qualquer autoridade política ou económica possa oferecer, rumo àquela esperança luminosa (cf. ibid., n. 35), que encontra a sua origem além de nós mesmos e, no entanto, manifesta-se no nosso interior como verdade, beleza e bondade. A liberdade procura uma finalidade e por este motivo exige uma convicção. A verdadeira liberdade pressupõe a busca da verdade — do verdadeiro bem — e por conseguinte encontra o seu próprio cumprimento precisamente no facto de conhecer e de fazer aquilo que é recto e justo. Por outras palavras, a verdade é a norma-guia para a liberdade, e a bondade é a sua perfeição. Aristóteles definiu o bem como "aquilo para o que todas as coisas tendem", e chegou a sugerir que, "não obstante seja digno alcançar a finalidade até para um único homem, todavia é melhor e mais divino alcançá-lo para uma nação ou para uma polis" (Ética a Nicômaco, 1; cf. Caritas in veritate, 2). Na verdade, a elevada responsabilidade de manter alerta a sensibilidade pela verdade e pelo bem depende de quem quer que exerça o papel de guia: nos campos religioso, político ou cultural, cada qual segundo o modo que lhe é próprio. Em conjunto, temos que nos comprometer na luta pela liberdade e na procura da verdade: ou as duas coisas caminham juntas, de mãos dadas, ou então perecem juntas miseravelmente (cf. Fides et ratio, 90).

Para os cristãos, a verdade tem um nome: Deus. E o bem tem um rosto: Jesus Cristo. A fé cristã, desde o tempo dos Santos Cirilo e Metódio e dos primeiros missionários, desempenhou na realidade um papel decisivo no acto de plasmar a herança espiritual e cultural deste país. A mesma coisa deve verificar-se no presente e em vista do futuro. O rico património de valores espirituais e culturais, que se exprimem uns através dos outros, não apenas deu forma à identidade desta nação, mas também a dotou da perspectiva necessária para desempenhar um papel de coesão no coração da Europa. Durante séculos, esta terra constituiu um ponto de encontro entre diferentes povos, tradições e culturas. Como bem sabemos, ela conheceu capítulos dolorosos e traz em si a cicatriz dos trágicos acontecimentos causados pela incompreensão, pela guerra e pela perseguição. E todavia, é também verdade que as suas raízes cristãs favoreceram o crescimento de um considerável espírito de perdão, de reconciliação e de colaboração, que tornou as populações destas terras capazes de voltar a encontrar a liberdade e de inaugurar uma nova era, uma nova síntese e uma renovada esperança. Não é precisamente deste espírito, que tem necessidade a Europa de hoje?

A Europa é mais do que um continente. Ela é uma casa! E a liberdade encontra o seu significado mais profundo precisamente no facto de ser uma pátria espiritual. No pleno respeito pela distinção entre as esferas política e religiosa — distinção que garante a liberdade de expressar o próprio credo religioso e de viver em sintonia com ele — desejo evidenciar novamente o papel insubstituível do Cristianismo para a formação da consciência de cada geração e para a promoção de um consenso ético de base, ao serviço de cada pessoa que chama a este continente "casa"!

Neste espírito, presto homenagem à voz de quantos hoje, neste país e na Europa, procuram aplicar a própria fé de maneira respeitadora mas determinada, na arena pública, na expectativa de que as normas sociais e as linhas políticas sejam inspiradas pelo desejo de viver em conformidade com a verdade que torna livre cada homem e cada mulher (cf. Caritas in veritate, 9).

A fidelidade aos povos que vós servis e representais exige a fidelidade à verdade, a única que constitui a garantia da liberdade e do desenvolvimento humano integral (cf. ibid., n. 9). Efectivamente, a coragem de apresentar de maneira clara a verdade é um serviço a todos os membros da sociedade: com efeito, ele lança luz no caminho do progresso humano, indica os seus fundamentos éticos e morais e garante que as directrizes políticas se inspirem no tesouro da sabedoria humana. A atenção à verdade universal jamais deveria ser ocultada por interesses particularistas, por mais importantes que eles possam ser, porque isto levaria unicamente a novos casos de fragmentação social ou de discriminação, que precisamente aqueles grupos de interesse ou de pressão declaram que desejam ultrapassar. Com efeito, a busca da verdade, longe de ameaçar a tolerância das diferenças ou o pluralismo cultural, torna o consenso possível e permite ao debate público conservar-se lógico, honesto e responsável, assegurando aquela unidade que as noções superficiais de integração simplesmente não são capazes de realizar.

Estou convicto de que, à luz da tradição eclesial acerca das dimensões material, intelectual e espiritual das obras de caridade, os membros da comunidade católica, juntamente com os de outras Igrejas, comunidades eclesiais e religiões, continuarão a procurar, nesta nação e alhures, objectivos de desenvolvimento que contenham em si um valor mais humano e humanizador (cf. ibid., n. 9).

Estimados amigos, a nossa presença nesta magnífica capital, frequentemente denominada "o coração da Europa", estimula-nos a perguntar-nos em que consiste este "coração". É verdade que não existe uma resposta fácil para tal interrogação, no entanto um indício é constituído seguramente pelas jóias arquitectónicas que adornam esta cidade. A beleza extraordinária das suas igrejas, do castelo, das praças e das pontes não podem deixar de orientar as nossas mentes para Deus. A sua beleza exprime fé; são epifanias de Deus que, justamente, nos permitem considerar as grandes maravilhas às quais nós, criaturas, podemos aspirar quando damos expressão às dimensões estética e cognoscitiva do nosso ser mais profundo. Como seria trágico, se se admirassem tais exemplos de beleza, ignorando contudo o mistério transcendente que eles indicam. O encontro criativo da tradição clássica e do Evangelho deu vida a uma visão do homem e da sociedade sensível à presença de Deus no meio de nós. Esta visão, ao plasmar o património cultural deste continente, iluminou claramente o facto de que a razão não termina com aquilo que o olho vê mas, ao contrário, ela é atraída pelo que está além, por aquilo a que nós aspiramos profundamente: poderíamos dizer, o Espírito da Criação.

No contexto da actual encruzilhada de civilizações, tão frequentemente marcada por uma alarmante separação da unidade de bondade, verdade e beleza, e pela consequente dificuldade de encontrar um consenso sobre os valores comuns, cada esforço para o progresso humano deve inspirar-se nesta herança viva. A Europa, fiel às suas raízes cristãs, tem uma vocação particular a sustentar esta visão transcendente nas suas iniciativas ao serviço do bem comum de indivíduos, comunidades e nações. De importância particular é a tarefa urgente de encorajar os jovens europeus mediante uma formação que respeite e alimente a capacidade, que Deus lhes conferiu, de transcender precisamente aqueles limites que às vezes se presume que os deve aprisionar. Nos desportos, nas artes criativas e na investigação académica, os jovens encontram de bom grado a oportunidade para se elevarem. Não é porventura também verdade que, se confrontados com altos ideais, eles hão-de aspirar inclusive à virtude moral e a uma vida fundamentada no amor e na bondade? Encorajo profundamente os pais e os responsáveis pelas comunidades, a fim de que esperem das autoridades a promoção de valores que sejam capazes de integrar as dimensões intelectual, humana e espiritual numa formação sólida, digna das aspirações dos nossos jovens.

"Veritas vincit". Este é o mote da bandeira do Presidente da República Checa: em última análise, a verdade vence realmente, não com a força, mas graças à persuasão, ao testemunho heróico de homens e mulheres de princípios sólidos, ao diálogo sincero que sabe olhar, para além do interesse pessoal, para as necessidades do bem comum. A sede de verdade, bondade e beleza, gravada pelo Criador em todos os homens e mulheres, está destinada a orientar conjuntamente as pessoas na busca da justiça, da liberdade e da paz. A história demonstrou amplamente que a verdade pode ser atraiçoada e manipulada ao serviço de ideologias falsas, da opressão e da injustiça. No entanto, os desafios que a família humana deve enfrentar não nos interpelam a olhar para além destes perigos? No final, o que é mais desumano e destruidor do que o cinismo que gostaria de negar a grandeza da nossa busca da verdade, e do relativismo que corrói os próprios valores que sustentam a construção de um mundo unido e fraterno? Pelo contrário, nós temos de readquirir a confiança na nobreza e na grandeza do espírito humano, pela sua capacidade de alcançar a verdade, e deixar que esta confiança nos guie no trabalho paciente da política e da diplomacia.

Senhoras e Senhores, com estes sentimentos exprimo na oração os bons votos para que o vosso serviço seja inspirado e sustentado pela luz daquela verdade que é o reflexo da Sabedoria eterna de Deus Criador. Sobre vós e as vossas famílias, invoco de coração a abundância das Bênçãos divinas.

Encontro com as autoridades políticas e civis e com o corpo diplomático
Castelo de Praga - Sala Espanhola
Sábado, 26 de Setembro de 2009

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